domingo, 28 de fevereiro de 2010

Exercícios de escrita

Durante muitos anos fiz exercícios de escrita. Continuo a fazer todos os dias exercícios de escrita. Sou um aprendiz da escrita. Não sou mestre da escrita. Não tenho nada para ensinar a ninguém nessa matéria.
As palavras ajudam a descobrir uma infinidade de coisas. As palavras compostas numa frase ajudam ainda mais. Mas pode brincar-se com as palavras. Mudar-lhes as rotas,os sentidos direccionais, os significados directos e fazer realçar aquilo que elas não querem dizer. Pode fazer-se tudo isso com as palavras. Não somos donos das palavras. Elas deixam, consentem, que brinquemos com elas, que façamos delas uma arte criadora, mas apenas nos consentem. Nada mais.
Outrora, quando fazia exercícios de escrita na primeira, na segunda e na terceira pessoa do singular, não passava de uma espécie de redneck atarantado e perdido num lago de nenúfares. Perguntava-me para que servia aquilo, todo aquele esforço de escrever páginas e páginas a caminho do lixo. Até que um dia, alguém disse: cria um blog. Escreve o que quiseres. Escreve um "journal". Escreve simplesmente.
Em vez do blog, comecei a encher caderninhos, tipo moleskine, de palavras inúteis e em relação às quais os amigos tinham uma condescendência gigantesca.
E aprendi que podem aglomerar-se palavras como se fossem correntes de escrita. Mas então preferi que as palavras fossem torrentes de escrita. Que cada um fizesse o que quisesse com elas, escrevesse como quisesse e quando quisesse.
As palavras apenas.

1 comentário:

  1. Gostei tanto de ler o seu texto!
    Gosto de pensar que escrever a palavra é dar-lhe vida, mas não é ser seu dono, ela depois cria à sua vontade nas cabeças de quem a lê, o que bem lhe apetece, basta para isso que o leitor tenha imaginação.
    Escrevo textos imensos na minha cabeça, vejo as palavras organizarem-se em frases, linha após linha, textos longos, poéticos, ou não, prosa objectiva ou nem por isso... acontece-me quase sempre à noite, antes de adormecer, escrevo livros inteiros. De manhã, não me lembro de quase nada, sei apenas que tinha matéria, mas evaporou-se, quando pego no teclado para escrever o que ainda me lembro, vem a auto-censura cortar-me a vontade e tudo o que me pareceu obra-prima, são agora, à luz do dia, ideias comuns, cinzentas, inférteis!

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